Um dia desses eu estava conversando com uma criança de 9 anos e ela entrou no assunto 'profissões'.
Ela começou a perguntar o que eu estudava e a falar sobre as profissões que ela gostava e o porquê. Lógico que nessa idade o 'porque' geralmente é: profissão tal porque minha tia é isso. Profissão tal porque faz não-sei-o-que.
Ela queria saber o que eu estudava, onde e etc.
Óbvio que a sementinha de adulto já tem os ensinamentos do berço e disse:
- "Não é chato, ser 'música'?(Se fosse para um adulto, talvez eu teria respondido: Nunca tinha pensado nisso! O que um dentista faz além de olhar boca? O que um dermatologista faz além de olhar peles? Etc )
- Não! Porque você acha que é chato?
- Ah! Sei lá ... porque músico fica lá olhando a música e tocando sozinho. Nem fala com ninguém. É muito parado...
- Parado eu te garanto que não é. Tem tantas coisas para estudar...
- Ah! Mas... mesmo assim. O que músico faz além de tocar?
Fim do papo porque algo a distraiu e tchau.
Cerca de 1 semana depois, a criancinha-projeto-de-adulto vem conversar comigo e volta ao mesmo assunto:
(Dessa vez com claras evidências do tipo de valores que os pais ensinam!)
- O que você queria ser antes de querer ser violinista?
- Um monte de coisas ...
- Fala uma! (ainda bem que ela disse 'uma' porque quando criança eu já quis ser: professora, desenhista de quadrinhos, escritora, tratadora de cavalos, marinheira, socorrista de ambulância, cientista, química - graças ao Mundo de Beakman -, lutadora de karatê, bombeira... Quando cresci um pouco mais: engenheira civil, arquiteta, economista, ... Prestei: medicina/enfermagem. Cheguei na iminência de fazer: enfermagem (9º lugar - Sta. Casa 2005)
- Médica.
- E porque você não foi médica?
- Porque eu percebi que não era isso que eu realmente queria para minha vida toda. E a gente tem que fazer o que gosta de verdade, né?
- Concordo e não-concordo. Mas você foi escolher ser 'música' e isso não dá dinheiro. Como você vai viver quando ficar mais velha?
- Ué? Mas então dinheiro é mais importante do que fazer o que realmente gostamos??
- Ah! ... eu gosto de tal-coisa, mas eu acho que vou acabar fazendo coisa-tal porque dá bastante dinheiro. E depois, quando eu ganhar muito dinheiro eu faço tal-coisa.
- E se você for fazer essa coisa que dá bastante dinheiro e achar muito chato e não conseguir emprego? Aí você vai ficar sem dinheiro e sem fazer o que gosta?
- Ah! Sei lá ... quanto músico ganha?
- O suficiente para viver.
- Que chato!
Naquela hora eu bem que quis ter uma conversinha com os pais de tão dócil criaturinha, mas desistijá que eles provavelmente me diriam que ela iria mudar de idéia sobre as profissões nos próximos anos por ainda ser uma criança. Evidente que a probabilidade dela passar por milhares de 'idéias' é enorme e natural.
O que não é natural é uma criança de 9 anos pensar na hipótese de fazer o que não gosta, mas que dá dinheiro! Isso é algo que fica enraizado. Afinal valores vem de berço e é esse o tipo que eles estão passando para ela!
Graças a Deus, papai e mamãe sempre me ensinaram que dinheiro/bens/etc não é nada além de consequência da vida e, embora seja necessário, nunca deve ser visto como o objetivo da vida!!
Antes que perguntem: Sim! Meus pais me questionaram quando resolvi assumir que música era o que eu queria fazer. Isso porque eu estava há algum tempo fazendo cursinho/prestando vestibular para medicina e eles queriam ter certeza de que eu não estava tendo uma crise de stress. Nunca falaram: "mas medicina dá status e dinheiro. Música não!"
Um comentário:
- Ah! Sei lá ... quanto músico ganha?
- O suficiente para viver.
- Que chato!
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